Estamos vivenciando uma crise hidrológica histórica. Entre setembro e maio foram registrados os menores índices pluviométricos dos últimos 91 anos, nas principais regiões geradoras de energia. Como consequência desse contexto alguns dilemas sobre a utilização da água estão postos. O mais evidente é a geração de energia. Contudo o nível dos lagos e rios fomenta o turismo, garante o transporte, abastece o setor agrícola e protege o ecossistema local. Assim a água deve atender a diferentes fins. Para coordenar essas ações o Governo Federal editou a medida provisória 1055, criando um comitê interministerial (CREG – Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidro energética). Para aumentar a segurança sobre o sistema elétrico e atenuar o déficit das empresas geradoras de energia elétrica a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou novos valores para as bandeiras tarifárias. A vermelha patamar 2, adotada no mês de junho a R$ 6,24 por 100kWh consumidos, vai custar R$ 9,49 em julho. 

As fontes de geração de energia alternativas têm um custo de produção muito maior que a geração hidroelétrica. Não haverá escassez de energia, mas quanto menor a participação hidro energética na produção de energia maior o preço pago. Na prática, para uma família que apresenta um consumo residencial médio, o reajuste tarifário representará um aumento de R$ 77,28 no ano, causando um efeito direto sobre a inflação. Além disso há um efeito indireto sobre o nível de preços, uma vez que os setores de produção de bens industrializados, agrícolas e varejo são intensivos na utilização de energia, e com as tarifas mais elevadas terão um aumento no custo de produção. E desta forma, uma parcela deste aumento será repassada ao consumidor final. 

Como o Banco Central tem o compromisso de manter a inflação dentro do intervalo alvo – atualmente entre 2,25% e 5,25% – e o mercado já estima um IPCA de 6,7%, certamente teremos uma revisão no ritmo de elevação dos juros básicos, a taxa Selic. Com isso, se não houver restrição ao crescimento econômico por escassez de energia como em 2001, haverá um golpe contra a recuperação econômica por conta dos juros maiores. Outra medida necessária para garantir o fornecimento irrestrito de energia é a flexibilização da vazão. Além do potencial de geração de energia, a disponibilidade de água nos rios e reservatórios deve ser avaliada como um recurso fundamental para manter o equilíbrio dos ecossistemas locais. Assim, independente da necessidade de fornecimento de energia é necessário manter um fluxo de água compatível com essa finalidade. Uma redução no volume de água vertendo das barragens dos lagos das usinas hidroelétricas poderão garantir uma reserva hídrica importante nesse período de estiagem, porém representam uma ameaça ao meio ambiente.  

Do ponto de vista econômico, a flexibilização da vazão pode representar mais um duro golpe ao combalido setor de turismo. Ainda sem se recuperar dos impactos da pandemia, seria atingido por uma redução na procura por serviços de lazer nessas regiões. 

Propostas para alívio no custo de geração de energia elétrica: horário de verão e contraturno industrial  

O horário de verão, desde sua adoção, em 1931, tem o objetivo de melhorar o aproveitamento da luz natural e reduzir a necessidade de energia concentrada no período das 18h às 21h. Durante o horário de pico o segmento produtivo ainda está em operação, as residências aumentam a demanda por energia e a iluminação pública municipal é acionada. No início de seu primeiro ano de governo, o Presidente Jair Bolsonaro extinguiu o horário de verão por considerar que a medida perdeu “razão de ser aplicada sob o ponto de vista do setor elétrico”. 

Entretanto, em meio à crise hídrica e aumento das contas de luz no Brasil, o governo declarou na terça, 29 de junho, uma nova medida de incentivo as empresas deslocarem o consumo do horário de maior demanda de energia para o de menor demanda, mudando os turnos.

Para a indústria ser motivada a mudar seu horário de funcionamento ela precisaria de incentivos. A sua força de trabalho passaria a receber adicional noturno, e nesse período, é sabido que o número de acidentes de trabalho aumenta. E com isso as empresas teriam que lidar com o aumento do custo, além de uma mudança cultural muito grande. Para incentivá-las, além de benefícios na tarifa de energia, seria necessário incentivo fiscal – e custaria muito ao governo em um momento que não há folga no orçamento. Assim a medida não seria efetiva em reduzir a sobrecarga sobre o sistema no horário de pico. 

Como alternativa, o retorno do horário de verão ao final de 2021 poderia produzir o efeito esperado, principalmente nas unidades federativas meridionais, coincidentemente os maiores consumidores de energia. Neste sentido, a Confederação Nacional do Turismo (CNTur) lançou uma proposta requisitando a volta deste horário especial. Diante deste cenário, é importante refletir sobre o real impacto dessa medida quando falamos na demanda por energia. A principal responsável pela geração de energia é a hidrelétrica. Sendo assim, quando o volume dos reservatórios é insuficiente para atender a demanda naquele momento, outras fontes são acionadas para entregar a quantidade necessária para a população. Essas alternativas, como eólica e térmica, contudo, são mais caras – e o valor é repassado para o cidadão. 

A companhia geradora de energia de uma determinada região ganha concessão e se compromete a entregar toda quantidade de energia demandada. Quando a indústria liga uma máquina ou uma família liga a televisão, aumenta o consumo de energia. O sistema tem que gerar, basicamente no mesmo instante, aquela energia. Por isso o horário de verão tinha sua importância ao descasar o fim do expediente produtivo com o acionamento da iluminação das vias públicas reduzindo a necessidade de energia concentrada em horários de pico.  

Portanto, a retomada do horário de verão em 2021 é uma prática recomendada pois em primeiro lugar a medida aumenta a eficiência e segurança do setor energético; em segundo lugar não onera os cofres públicos e por fim, mas não menos importante, ainda incentiva o setor de turismo. Avante ao seu retorno! 

Por Eduardo Amendola Camara – Economista e Docente da Estácio