As séries televisivas e das plataformas de streaming atualmente trazem contextos muito interessantes para ampliar nossas percepções e refletirmos sobre diversos assuntos. A produção espanhola (As Telefonistas) (Las Chicas del Cable, Netflix), registra as dificuldades que as mulheres trabalhadoras enfrentaram na década de 1920, passando por temas polêmicos, como a bissexualidade, violência doméstica, aborto, transexualidade e desigualdade de gênero.

Ao refletirmos sobre a condição da mulher ao longo dos tempos, percebemos que o patriarcado afetou consideravelmente a condição feminina.

No Paleolítico, a mulher possuía uma valorização advinda do mistério da vida. Ainda não existia vínculo entre sexo e procriação. Acreditava-se que a fertilidade era exclusivamente feminina. Naquela época, as mulheres tinham um certo prestígio devido ao dom da criação. Inexistia a submissão, nem mesmo estética. O símbolo sexual do período era a Vênus de Willendorf, com nádegas e seios fartos, barriga proeminente e quadris largos.

Passaram-se mais de 15 mil anos em que homens e mulheres conviveram em paz, até os homens abandonarem a caça e serem incluídos nas atividades das mulheres. Foi quando eles perceberam que as ovelhas separadas dos carneiros não geravam cordeiros nem produziam leite. Já as ovelhas cobertas pelos carneiros tinham cordeiros após um tempo constante.

Com esta descoberta, os homens identificaram a contribuição do macho na procriação. E mais: concluíram que um único carneiro podia emprenhar mais de cinquenta ovelhas. A suposta superioridade instaurada gerou déspotas e opressores que se julgaram enganados por anos, como se fosse um prejuízo.

Na ocasião, a mulher perdeu sua liberdade sexual. Surgiu a noção de casal. Para garantir a fidelidade e a paternidade de seus filhos. Dessa forma, tornaram-se propriedade do marido, que costumava puni-las e matá-las como exercício de um direito. Naquele momento foram germinadas as sementes do feminicídio.

O patriarcado instituiu a ideia de dominação, considerando o homem superior à mulher. E assim, mulheres ficaram confinadas em casa para evitar contato com outros homens. Algumas utilizavam cintos de castidade. Tivemos alguns casos de extirpação do clitóris para conter as pulsões eróticas. Tudo isso com a desculpa de fazer filhos legítimos. O sistema patriarcal escravizou as mulheres. Até as leis de propriedade de herança foram alteradas contra elas. Foi somente na Revolução Francesa que as filhas retomaram seus direitos à herança.

A sexualidade sempre representou um perigo. Em 1183 a Igreja criou os tribunais da Inquisição com o objetivo de combater a luxúria. Acreditavam que a instituição perderia sua autoridade se a liberdade sexual se generalizasse entre o povo.

Em meio a tanta submissão damos um salto na história e caímos na Revolução Industrial. Com a entrada das mulheres no mercado de trabalho, elas recebiam um salário inferior ao dos homens, por serem consideradas o sexo frágil. Dá-se o início de uma dupla jornada. Teriam que dar conta dos serviços domésticos e do trabalho remuneratório.

Em 1980 muitas mulheres impressionadas pelo mito da beleza adquiriram a tripla jornada, dedicando parte de seu tempo para cuidar do corpo. Este mito atualmente reverbera por uma musa fitness, com fotos que vendem o sonho de um corpo perfeito, sem perceber que a estética também é mais uma forma de submissão e denuncia a desigualdade entre os gêneros.

Quando consideramos um homem de 50 anos, grisalho e experiente sensual, geralmente não valorizamos a mulher possuidora dessas mesmas características. E assim, reafirmamos essa desigualdade, pois no universo feminino existe uma supervalorização da juventude. Dados apontam o Brasil como o segundo país no ranking de cirurgias plásticas. São números assustadores que vendem expectativas irreais.

Além disso tudo, nos deparamos com violências e relações abusivas. Violência psicológica, moral, física e sexual. Muitas mulheres não enxergam que as pessoas abusivas são manipuladoras e diminuem o outro para efetivar sua suposta superioridade.

Para que exista uma conquista de equidade, precisa existir uma libertação do patriarcado e de qualquer forma de submissão.

As mães são as principais reprodutoras da desigualdade de gênero. Enquanto parceiras, as mulheres não deveriam admitir nenhum tipo de abuso.  E a preocupação estética pode ser percebida como mais uma forma de submissão, pois a liberdade deve ser uma prática diária.  

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Aline Esteves, sexóloga e psicanalista 
www.alineesteves.com
insta: @aline.esteves.sexologia