A maneira ou as condições que mantemos nossos animais (sejam cães, gatos, aves, peixes, etc.) irá refletir sobre seu bem estar. Isso é uma condição básica, um ambiente pobre, ou seja, sem estimulação sensorial e/ou cognitiva vai prejudicar a vida dos nossos amigos.

Quando trouxemos os animais domésticos para próximo de nós (efetuamos a domesticação propriamente dita), sem dúvida consolidamos um empobrecimento da vida desses animais. Imagine a vida de um animal silvestre, todos os desafios que ele enfrenta, as inúmeras situações desafiadoras, tudo isso faz da vida desse indivíduo uma sucessão de desafios. Ou seja, a vida desse animal é altamente complexa. O inverso é verdade para o animal doméstico, sua alimentação é regular, previsível, tanto em horário como em itens oferecidos, normalmente esse animal será castrado, o que torna sua vida também regular do ponto de vista sexual, o ambiente doméstico também é altamente limitado. Tudo isso faz da vida desse animal algo monótono. E com o passar do tempo essa situação irá caminhar para uma condição de tédio, e até com manifestações de patologias comportamentais complexas.

Como combater essa situação, e prevenir tal condição prejudicial para nosso pet? Uma alternativa eficaz é o enriquecimento ambiental, atualmente essa é uma área do estudo etológico, mais especificamente do bem estar animal.

O enriquecimento ambiental foca a inclusão de itens ou situações em que o animal irá ter de solucionar problemas, alcançando recompensas, que podem ser alimentos, atenção, conforto, etc. Então é muito fácil resolver tal problema? Não, temos vários fatores complicadores, por exemplo, a habituação, isso ocorre quando uma situação proposta perde seu efeito, o animal não será estimulado efetivamente depois de algum tempo, ou número de tentativas, para continuar a interagir com a atividade proposta.

São muitas as alternativas e métodos que podem ser colocados em prática nesse sentido. Por exemplo, podemos dividir essas alternativas em 2 grandes grupos: um que contará com a participação do tutor, o que pode limitá-la, já que só será desenvolvida com a sua participação e nem sempre podemos estar presentes, por exemplo para gatos no meio da noite, ou quando estamos trabalhando fora de casa. A outra divisão é o animal sozinho interagir com o item estimulador, esse é mais interessante, pois o animal poderá interagir sempre que estiver interessado, sem a exigência de nossa presença. Este tipo pode ser dividido em 2 opções também: o animal ocupar uma caixa, local, etc., e a outra divisão seria apenas interagir (comendo alguma recompensa que é apresentada automaticamente ou apenas interagindo com a pata, etc.).

Fique muito atento, pois há algumas condições que devem ser respeitadas, vamos destacar algumas das mais importantes:

Segurança do animal (ou da pessoa que irá interagir), esse fator é crítico, qualquer brinquedo, ação, etc. deve ser muito bem avaliado para impedir qualquer problema. Algumas situações por mais inofensivas que possam parecer devem ser avaliadas. Por exemplo, brinquedos com barbantes podem enroscar na pata do animal e estrangular o membro, causando sério dano.

– Praticidade: esse item deve ser sempre considerado, pois não podemos depender de uma sequência complexa de situações para o animal receber o estímulo, isso vai dificultar a aplicação. Uma sugestão é conseguir associar algum dispositivo que faça a aplicação independentemente da nossa presença. Por exemplo, temos os relógios de ciclo (ou temporizadores) que ligam e desligam de maneira programada, um rádio, ou outro dispositivo elétrico que irá estimular o animal. Portanto você pode programar um rádio, para ligar e desligar várias vezes por dia quando você estiver fora de casa.

Economia: nossos amigos podem querer destruir o item que você apresentou. Então devemos considerar a economia também, logo itens de papelão, ou algo que possa ser reposto sempre que necessário sem grandes gatos são interessantes.

– Renovação do item: esse é um ponto bastante importante, como citado anteriormente o animal irá habituar-se com a estratégia proposta. Após algum tempo vamos perder a eficiência da estratégia, seja ela qual for, mesmo a mais estimulante terá seu período de efeito máximo, e daí por diante o animal perderá seu interesse. Temos de ter em mente que devemos sempre ter mais de uma alternativa, não apresentar todas ao mesmo tempo, renovar as idéias. Ou seja, o ideal seria ter um “cardápio” de sugestões e ir alternando-as aleatoriamente.

Na verdade o que tentamos fazer com a vida de nosso pet é torná-la mais complexa. Infelizmente ao domesticá-los fizemos o inverso e agora tentamos corrigir isso de maneira controlada. Por isso você pode se basear e apresentar suas sugestões de enriquecimento ambiental para seu pet na vida natural, quando essa espécie, seja ela qual for ainda vivia sua vida selvagem, por mais distante que isso possa ter ocorrido.

Vou deixar alguma sugestões para o mais curiosos, são experimentos controlados, feitos de maneira especialmente cuidadosa para mensurar o efeito da estratégia, lembre-se que nossos amigos são tão exigentes como nós, mesmo o livro, o filme, o esporte mais interessante irá, em algum momento, tornar-se pouco efeito em manter nossa atenção, daí teremos de ter alguma sugestão para variar, logo seja criativo, tome isso como um  desafio para manter a qualidade de vida de seu pet sempre num nível elevado.

Sugestões:

1) Nesse estudo tivemos como foco gatos mantidos em ambientes pouco estimuladores, testamos caixas como refúgios para o seu enriquecimento ambiental, aumentando as possibilidades do uso do espaço disponível.

http://www.mdpi.com/2076-2615/5/2/245

2) Aqui a atenção estava voltada para a inclusão de odores na vida de gatos mantidos em grupo.

https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/avj.12253

3) Neste artigo (à partir da página 32) discuto a importância de valorizarmos a vida natural do gato para minimizarmos os problemas comportamentais.

http://www.crmvsp.gov.br/arquivo_midia/revista_educacao_continuada_vol_11_No_1_2013.pdf

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 Gelson Genaro
Médico veterinário formado pela Universidade Estadual  Paulista (UNESP) de Jaboticabal (SP), com mestrado e doutorado pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP em Fisiologia. Professor da disciplina Bem Estar Animal, no Centro Universitário Barão de Mauá, de Ribeirão Preto (SP)